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Resenha Nós

Considerado o precursor do gênero de ficção futurística, Yevgeny Zamyatin em sua obra "Nós", cede as páginas a D-503 que as torna um manuscrito direcionado à uma sociedade até então não conhecida e, por isso, selvagem, insociável.

A história se passa em uma cidade-estado comandada por um Estado Único, gerenciado pelo Benfeitor, que é a autoridade máxima de seus súditos, os números. Lá, se vive um mundo baseado na racionalidade, na matemática, no padrão e igual, na exatidão.

A distopia conta a vida de D-503, que era um devoto ao regime totalitário do Benfeitor que construía o INTEGRAL, que é uma nave que tinha o objetivo de civilizar novas populações e "forçá-las a serem felizes". Entretanto, após conhecer e se apaixonar por E-330, se vê em duas pessoas. Por um lado, se tem D-503 matemático e racional, aquele que vive cada instante à vista de todos e preza o 'nós', o conjunto; por outro lado, se tem D-503 individual e não mais coletivo, o que ama e sente. 

No decorrer do romance, o protagonista, vai se aceitando de uma só forma. Sonha, imagina e fantasia - tudo o que sempre fora estritamente proibido. Se descobre doente então, por ter alma.

Por ser quase que como um diário, a leitura fica confusa, de modo que os devaneios de D- atrapalham a compreensão imediata. O escritor vai e volta em situações e por vezes não conclui pensamentos, colocando apenas reticências.

A obra não estimula ansiedade por novas páginas, não só por conta da escrita, que é antiga, mas também porque não acontecem grandes causos. Entretanto, a história é bem elaborada e bem construída. O autor, um revolucionário de sua época, ousa demais em criticar a sociedade dessa forma já naquele tempo. Julga a coletividade e a não existência do 'eu', fala da invasão de privacidade e da sujeição à figura máxima, deixa explícito a falta de laços e criação de vínculos com o outro... A atualidade de um livro de 1920 permanece ainda intacta após 100 anos.

A quem gosta de distopias, é estritamente recomendado. É um livro valioso ignorado que vale a leitura, não só por ter sido o que inspirou 1984 e Admirável Mundo Novo, mas também por nos fazer refletir sobre qual é a nossa prioridade. O 'eu' ou o 'nós'?

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